Marcas e registro em blockchain: Qual a necessidade (se é que existe)?

Marcas e registro em blockchain: Qual a necessidade (se é que existe)?

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Quando o assunto é proteção de marcas, a primeira imagem que vem à mente é o tradicional registro no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). Esse é o caminho jurídico oficial, aquele que assegura direitos exclusivos de uso e dá respaldo em disputas. Mas, nos últimos anos, um novo ator entrou em cena: o registro em blockchain.

E aí surge a pergunta que inquieta empreendedores, profissionais e até advogados: será que faz sentido registrar uma marca em blockchain?

A resposta talvez não seja um simples “sim” ou “não”.

O registro tradicional: indispensável, mas limitado

Não há dúvidas de que o registro de marca no INPI é insubstituível quando se fala em direitos legais. É ele que confere a titularidade oficial, permitindo impedir terceiros de usar sinais iguais ou semelhantes.

A doutrina é firme nesse sentido. Denis Borges Barbosa define a marca como um "sinal distintivo que, além de individualizar produtos ou serviços, exerce a função de garantir ao seu titular a exclusividade de uso em determinado ramo de atividade" (BARBOSA, Denis Borges. Curso de Direito da Propriedade Industrial, 2021).

Além disso, o art. 129 da Lei de Propriedade Industrial (Lei 9.279/96) reforça que a propriedade da marca se adquire pelo registro validamente expedido, conferindo ao titular o direito de uso exclusivo.

Mas há um ponto sensível: até a concessão definitiva, a marca permanece em situação vulnerável, ainda que exista expectativa de direito. É nesse intervalo que muitas disputas podem surgir.

A proposta do blockchain: imutabilidade e prova instantânea

O registro em blockchain não substitui o INPI, mas agrega uma camada de proteção que o sistema tradicional não entrega: a prova tecnológica, rápida e imutável, que atesta a existência da marca em determinada data.

Aqui, a doutrina processual encontra espaço. Como destaca Fredie Didier Jr., “o processo civil contemporâneo adota a cláusula geral da atipicidade dos meios de prova, desde que moralmente legítimos” (Curso de Direito Processual Civil, 2020). Ou seja, qualquer meio idôneo pode ser aceito para formar a convicção do juiz.

A jurisprudência vem confirmando isso. O TJSP, em acórdão de 2022 (Apelação Cível nº 1003434-62.2020.8.26.0100), reconheceu a validade de registros em blockchain como prova de anterioridade de obra intelectual, ressaltando que a tecnologia confere autenticidade pela impossibilidade de adulteração.

Mais do que inovação, o blockchain já é visto como um instrumento probatório legítimo.

Duas frentes que podem se complementar

Diante disso, o ponto central não é escolher entre blockchain e INPI, mas sim perceber que ambos se complementam.

  • O registro da marca no INPI assegura exclusividade legal, reconhecida pelo Estado.
  • O registro em blockchain entrega prova instantânea, imutável e de alcance global.

Enquanto o primeiro confere a espada jurídica, o segundo oferece o escudo tecnológico.

O professor Newton Silveira, em seus estudos sobre propriedade intelectual, já alertava que a disciplina deve acompanhar as transformações tecnológicas para não se tornar anacrônica (Propriedade Intelectual: Estudos, 2019).

O blockchain, portanto, não rompe com o sistema tradicional, mas o fortalece.

O olhar estratégico

Se a lei e a doutrina firmam o INPI como núcleo da proteção marcária, a prática demonstra que a tecnologia é aliada. O STJ já reconheceu, em julgados sobre prova digital (REsp 1.685.842/SP), a validade de documentos eletrônicos para fins probatórios, desde que respeitada a integridade e autenticidade. Nada impede que a mesma lógica se aplique ao blockchain.

Além disso, decisões recentes reforçam que a anterioridade de uso pode ser determinante em conflitos marcários. Em tais casos, um registro em blockchain pode servir como evidência complementar de boa-fé e pioneirismo, ajudando a construir a narrativa jurídica em defesa do titular.

Assim, não se trata de mera curiosidade tecnológica. É uma ferramenta estratégica que dialoga diretamente com os conceitos de segurança jurídica e eficiência processual.

Conclusão

A questão, portanto, não é se existe ou não necessidade de registrar uma marca em blockchain. A pergunta correta é: quanto vale a tranquilidade de ter mais uma camada de proteção sobre um dos maiores ativos de um negócio?

O blockchain não elimina o registro no INPI, nem deve competir com ele. Pelo contrário: os dois se fortalecem mutuamente. Um garante a exclusividade legal; o outro adiciona velocidade, imutabilidade e reconhecimento internacional.

No fim, a resposta é simples: faça os dois.

Juntos, eles não apenas protegem a marca, mas também constroem um alicerce sólido para o futuro da identidade empresarial.